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1.2.10

Invictus














No ipsilon desta semana, John Carlin, autor do livro 'Playing the Enemy', que inspirou este filme, diz que talvez o facto de Clint Eastwood ter tratado tantas vezes ao longo da sua carreira o tema da vingança, tenha sido precisamente o que o atraiu neste projecto. É uma ideia sedutora: ao contrário de tantas personagens encarnadas por Eastwood, do vingador solitário, Mandela aguentou 27 anos num buraco às mãos dos algozes do Apartheid e saiu de lá focado no perdão e na reconciliação, nunca na vingança - precisamente por não ser um lonely ranger, mas antes um homem que pôs sempre o interesses nacional à frente de tudo. Um herói dos nossos tempos, sem dúvida. Mas, claro, não o tipo de herói que à partida seja bom material para um biopic, a não ser para puxar pela lágrima ou para a hagiografia. Qualquer psicopata sinistro a la Idi Amin é naturalmente mais interessante para um ficcionista.

Eastwood não seria a escolha mais óbvia para filmar esta história sobre Mandela, sobre Francois Pienaar, sobre a nova África do Sul, sobre racismo e reconciliação, mas também John Ford não seria a escolha óbvia para filmar 'As vinhas da ira', e algum do desconforto que por aí vemos em relação a 'Invictus' será do mesmo género do sentido à altura em relação a Ford.

Eastwood não conseguiu contornar todas as dificuldades inerentes ao projecto e, ao contrário de Ford no caso citado, fazer uma obra prima - nem sequer reinventar o biopic, esse género sensaborão por excelência - mas dá-nos um sólido filme humanista, um retrato justo e rigoroso de um homem excepcional, e põe-nos, de passagem, a apreciar um jogo de rugby durante largo tempo (desporto que dirá tão pouco à generalidade dos portugueses como à dos americanos). Dificilmente alguém teria feito melhor.

Invictus, E.U.A., 2010. Realização: Clint Eastwood. Com: Morgan Freeman, Matt Damon, Tony Kgoroge, Julian Lewis Jones, Adjoa Andoh, Patrick Mofokeng, Matt Stern, Leleti Khumalo.

2 comments:

João Palhares said...

O filme fez-me lembrar aquela máxima do scorsese: "one for them, one for yourself". Este é para eles, mas não deixa de ser um bom filme por isso.
Podia era ter explorado melhor a comparação Mandela/Obama (e não estou a dizer que os problemas de Obama sejam comparáveis aos que Mandela teve de enfrentar), fazer um filme tão sobre a África do Sul como sobre a América (como na cena do avião a rasar no estádio, por exemplo).

Unknown said...

É um Clint um pouco 'anónimo', é verdade, mas não sei se será tanto uma 'encomenda' como dizem...