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29.5.07

10 filmes da vida de...

...atomo!, Designer de Multimédia e Ilustrador, 32 anos, com uma curiosidade cinéfila levada à obsessão, editor do Bitlogger.

Uma selecção destas é sempre injusta e quase nunca reflecte o que vou vendo actualmente e não inclui inúmeras obras que aprecio de forma apaixonada. Mais do que fazer uma selecção coerente e que reflecte quaisquer géneros que prefira, escolhi estes 10 favoritos (sem qualquer ordem de preferência) de uma lista de mais de 50 ‘essenciais pessoais’ que me causa amargura de também não caberem aqui.

Como nota de rodapé, gostaria também de dizer que nestes dez filmes também a banda sonora teve uma importância grande na escolha e, já agora, que a linguagem algo pontuada por conceitos ‘psicanaliticos’ não foi intencional (embora seja estranha).



Vertigo (Alfred Hitchcock, 1958)
Seria fácil incluir na lista qualquer dos ‘filmes americanos’ de Hitch, mas optei por este devido às constantes revisitações obsecadas. Para além de qualquer interesse na narrativa imediata de Vertigo, retenho mais aqui os constantes jogos sádicos a que Hitch submete o espectador (e claro as suas personagens) e sobretudo as pulsões interiores que são taboos e que poucas vezes foram mostradas desta forma no Cinema, subtis mas inquietantemente presentes.

Carnival of Souls (Herk Harvey, 1962)
Harvey, com uma carreira pouco extensa e muito dedicada ao chamado cinema efémero, recicla aqui toda a extensa e gigantesca herança que o Expressionismo imprimiu no Cinema Americano (e que ainda se continua a sentir, em bons e maus exemplos) e do chamado American Gothic para criar um filme inovador e que ainda hoje causa arrepios.
Todos os pormenores da 'alma perdida' que protagoniza o filme, dos gestos mais quotidianos à pura alienação mortal, fazem deste filme um dos mais hipnóticos exemplos do cinema (dito) fantástico, que me atrai sobretudo devido à mestria técnica de Harvey, que nunca precisa de recorrer a efeitos especiais elaborados para fazer o espectador cair em transe.

À Bout de Souffle (Jean-Luc Godard, 1960)
De certa forma uma reflecção sobre o Film Noir (poucos são ainda os estudiosos que injustamente atribuem a vital importância ao filme criminal francês do pré-II Guerra Mundial no género), o Acossado é também aquilo que mais gosto no Godard dos 60s: um permanente voyerismo pela geração da nouveaux Paris (mais nova do a do mestre) e a desculpa de filmar uma história para referenciar (e ‘reverenciar’) as inúmeras referências culturais e pop de uma geração de teóricos.

Sayat Nova (aka Colour of Pomegranate, Sergei Parajanov, 1968)
Contando a história do trovador e poeta arménio do século XVIII, Parajanov construiu um dos filmes mais estilizados e artisticamente precisos que há memória em toda a história do Cinema (desculpem o pedantismo).
Cada frame deste filme é uma obra de arte que oferece ao espectador não a narrativa 'realista' da vida de Sayat Nova (que estava na intenção do Regime Soviético quando contractou Parajanov para tal), mas o simbolismo poético que compõem uma biografia. Pura poesia visual.

Faster, Pussycat! Kill! Kill! (Russ Meyer, 1965)
Este deve ser o mais singular filme de Meyer, aquele onde as suas avantajadas vixens, sempre representadas através do desejo masculino, se tornam aqui no próprio gerador desse mesmo ‘objecto’ desejado, num ‘jogo de espelhos’ que revela as pulsões masculinas mais primais.

Tentando desculpar-me desta descrição algo barroca, em Faster Pussycat!, para lá do aço dos automóveis (sempre um símbolo fálico e simultaneamente americano) e da carne abundante das personagens femininas, fica um excitante retrato de uma violência caricatural quase indomável, presente na personagem de Varla (a actriz de culto Tura Satana), que tem o seu apogeu nos 70s e que agora serve de ‘muleta’ a todos estes recentes revivalismos dos clássicos dos filmes de grind house.

Scorpio Rising (Kenneth Anger, 1964)
Um dos filmes mais ambíguos do cinema independente americano (e também um dos que mais amores e ódios gerou), Scorpio Rising é a minha obra favorita de Anger, sobretudo pela forma como consegue criar uma imagem icónica, recriando todo o sentido do termo cultura pop americana e sobretudo o que era de facto rebeldia visual, e que agora é apenas um cliché camp.

Usando técnicas (e um formato) cinematográficas apenas repetidas muito mais tarde com a ascensão do videoclip musical (já nos 80s), Scorpio Rising, na sua curta meia hora de duração, é uma espantosa reflecção sobre a cultura popular americana, sempre presente nos chamados biker films. Usando as mesmas pulsões que The Wild One (László Benedek, 1953), Anger entrega aqui uma despudorada visão sobre um dos mitos heróicos americanos, criando um espantoso catálogo de fetichismos cinematográficos (e outros).

Lost Highway (David Lynch, 1997)
Com a invocação de Meshes in the Afternoon (Maya Deren, 1943... outro que ficou de fora), Lynch começa aqui a sua final consolidação de uma linguagem visual em ‘camadas’ e elipses narrativas (a chegar a um excelente e ‘barroco’ amadurecimento), pegando no Cinema Clássico para criar o que será (e já é) a nova forma de narrativa visual, consolidada com Mulholland Drive e Inland Empire.

One, Two, Three (Billy Wilder, 1961)
Não existe um único filme de Wilder que não devesse estar nesta lista. Para evitar citar The Seven Year Itch, Sunset Blvd., Double Indemnity ou The Apartment, todos escolhas 'fáceis' de justificar (são favoritos desde o final da infância), escolhi este fabuloso e corajoso exercício de sarcasmo com um sentido visionário sobre o que estava a passar na Berlim dividida após a II Grande Guerra. Como em quase todos os filmes de Wilder, nunca as palavras foram tão cortantes, nesta estranha fábula multinacional, onde o slapstick verbal asume contornos quase perigosos. Tal como na altura da estreia este é ainda o mais ‘incómodo’ filme de Wilder, como aqueles que estava presentes numa célebre exibição da versão uncut deste filme na Cinemateca Portuguesa aqui a uns anos se lembram, com uma estranha batalha verbal entre várias facções (não só cinéfilas) na plateia.

Yojimbo (Akira Kurosawa, 1961)
Mais ‘modesto’ que a obra-prima Sete Samurais (será?) Yojimbo é uma das obras mais completas que me lembro. Temos um realismo que não tem vergonha de mostrar comédia e a tragédia humana, o anti heroismo marcadamente ‘Kurosawiano’, um icon do ‘novo’ western (Mifune) e a continuação do quebrar com o passado imperialista japonês, com a sua humanização dos heróis e uma desacralização dos simbolos. Tecnicamente, como qualquer filme de Kurosawa nos 50s e 60s este filme é também um catálogo soberbo de inovações filmicas, que dá um gozo especial ver (e ouvir).

Laura (Otto Preminger, 1944)
Tal como Vertigo, aqui Preminger (outro autor fetichista), conta um estranho conto de necrofilia, onde todas as palavras, gestos e objectos parecem ter duplos sentidos. Conduzidos pela magnífica e ácida personagem Waldo Lydecker (uma das minhas personagens favoritas de sempre), somos levados por uma estranha viagem voyerista de pulsões freudianas onde a personagem do título, com o estranho nome de Laura Hunt (a espantosa Gene Tierney) faz revelar os cantos mais escondidos e estranhos do desejo humano e onde as máscaras psicológicas possuem vida própria.

Todas as semanas um blogger cinéfilo fala aqui de 10 filmes da sua vida. O próximo convidado é esponja, aka Allen Douglas.

4 comments:

Unknown said...

não vi 3 dos filmes...record igualado!

Nuno said...

Só posso aplaudir a presença de Kurosawa na lista ;)

(e claro de outros: Godard, Wilder, Lynch, Hitchcock...)

C. said...

Vi 6... boa lista!

atomo! said...

Obrigado!

Estas são semrpe escolhas difíceis, mas confesso que no topo, para além destes, estavam filmes como o Valerie and Her Week of wonders, O Tesis (fabulosa feature de estreia de Amenábar), The Ghost and Mrs Muir, I Know where I'm Going (que fico satisfeito estar já por aqui incluido noutra lista) ou Mujeres al borde de un ataque de nervios... infelizmente não inclui nenhum filme espanhol, o que é um pecado... mas fica para uma próxima lista