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14.5.05

Mondovino



Mondovino já foi acusado de ser uma espécie de Sideways filmado por Michael Moore. Ou seja um documentário politico, de esquerda, manipulador, servindo-se do mundo do vinho como pretexto para atacar a globalização. É verdade que Jonathan Nossiter tem uma opinião política, militante digamos, sobre este mundo: que os grandes produtores (representados pela poderosa familia americana Mondavi), ajudados por alguns enólogos 'superstars' (representados por Michel Rolland, o mais famoso da actualidade) e críticos de vinhos interesseiros (representados pelo influentissimo Robert Parker) estão a impor um 'gosto' aos consumidores, normalizando-o, condenando assim os pequenos produtores, os que ainda produzem vinhos com especificidades próprias. É também verdade que Nossiter tem algumas das virtudes de Michael Moore: o sentido de humor (pré- Fahrenheit 9/11) e a capacidade de caracterizar as pessoas deixando-as simplesmente falar. Mas tudo o resto é diferente, é outro mundo. Desde logo a maneira de filmar, com enquadramentos muito originais e a câmara sempre irrequieta, a montagem muito trabalhada e conseguida, que afastam totalmente Mondovino do género documentário televisivo. Ou seja, Nossiter é mais cineasta. Mas, a diferença definitiva é o fascínio de Nossiter pelas pessoas que filma (mesmo por aquelas de que não gosta). Michael Moore serve-se das pessoas para demonstrar uma tese; Nossiter deslumbra-se com as pessoas e até nos faz esquecer que nos está a ser enfiada uma tese. Embora seja um profundo conhecedor de vinho - foi escanção, por exemplo - e se note a sua paixão por ele, a sua matéria de eleição aqui são as pessoas que encontrou neste mundo, todas elas personagens bigger than life, desde o aristocrata francês Herbert de Montille e a sua orgulhosa e intransigente filha à poderosa familia americana Mondavi (e repare-se que dos pequenos aos grandes produtores os negócios estão sempre na mão de famílias). Em entrevista ao Público o realizador disse algo muito interessante: "Quando visitei a propriedade da família de Montille senti-me como num filme de Marcel Carné ou Jean Renoir. Quando filmei Michel Rolland, achei-me no mundo Hollywoodiano dos anos 80. Já com Battista Columbu na Sardenha tive a impressão de estar dentro de um filme de Rossellini ou de Sicca". E nós poderiamos continuar: quando visita as famílias dos produtores aristocráticos italianos Frescobaldi e Antinori lembramo-nos inevitavelmente do Leopardo de Visconti, os aristocratas a passarem o testemunho à 'burguesia', ou seja, à familia Americana Mondavi, que aliás nos faz lembrar...os Corleoni! É claro que só podemos dizer bem de um filme que nos dá uma galeria de retratos como esta, e até desculpamos a Nossiter algum maniqueísmo, traduzido no facto de não resistir a ridicularizar desnecessariamente os 'poderosos', como quando nos mostra duas jovens de uma família 'bem' italiana a dissertarem sobre o bem que Mussolini fez ao seu país ou uma rica proprietária Americana a dizer que tratam os empregados Mexicanos como iguais, até lhes dão umas tshirts e tal! Não é que não gostemos de Michael Moore, mas quando nos estão a servir Renoir ou Visconti...

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