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18.1.11

Dia e Noite


Eu sei que no actual mundo facebookiano e supersónico, falar de um filme que estreou há já meio ano é um crime. Mas eu sou um bocado bota de elástico e ainda ando a pôr em dia as estreias do ano passado (mais vale tarde do que nunca, etc. ).

E agora, com a devida licença dos leitores mais culturetas, vou passar a dizer bem deste ‘Knigth and Day’: é totalmente inverosímil e compraz-se com isso; é muito divertido, pilhando e parodiando tudo quanto é filme de acção/espionagem e, já agora, comédia romântica; tem duas grandes prestações, de Mr.Cruise e Mrs.Diaz (dois actores que habitualmente estão longe de ser dos meus favoritos); e, last but not the least,  tem um realizador que, pese embora a sua irregularidade, tem uma competência acima da média.

Tem a fita zero de originalidade? É verdade. Mas sabe baralhar e tornar a dar com muita classe e ironia. É - perdoem-me o termo técnico - o melhor filme de Domingo à tarde do ano que passou.

Knight and Day, E.U.A., 2010. Realização: James Mangold. Com: Tom Cruise, Cameron Diaz, Peter Sarsgaard, Jordi Mollà, Viola Davis, Paul Dano.

23.12.10

RED - Perigosos


Vá-se lá saber porquê, pareceu-me que este RED seria um bom filme natalício e, já que me escapara nas salas, toca a vê-lo no aconchego do lar.

O filme insere-se no género thriller-cómico-razoavelmente-palerma e, mesmo cumprindo os mínimos, há que dizer que podia ser bem mais divertido e - algo de que há um défice gritante na actual Hollywood - imaginativo.

No fundo serve apenas para provar pela enésima vez que Bruce Willis - que comanda uma brigada do reumático de peso (John Malkovich, Helen Mirren, Morgan Freeman, Brian Cox, Richard Dreyfuss - a que se junta a sempre luminosa Mary-Louise Parker) continua imbatível neste género, sem sucessor à altura.

RED, E.U.A., 2010. Realização: Robert Schwentke. Com: Bruce Willis, Mary-Louise Parker, John Malkovich, Helen Mirren, Karl Urban, Morgan Freeman, Rebecca Pidgeon.

15.12.10

Top 10 - 2010


1.
A dança – Le Ballet de l`Opéra de Paris, Frederick Wiseman

2.
 Cópia certificada, Abbas Kiarostami

3.
 Polícia sem lei, Werner Herzog

4.
 O escritor fantasma, Roman Polanski

5.
 As ervas daninhas, Alain Resnais

6.
 Eu sou o amor, Luca Guadagnino

7.
 Meu filho, olha o que fizeste!, Werner Herzog

8.
Presente de morte, Richard Kelly

9.
 Shirin, Abbas Kiarostami

10.
Shutter Island, Martin Scorsese

9.12.10

Cela 211


Um dia antes de entrar ao serviço, Juan vai até à prisão onde iria ser guarda prisional, para começar a conhecer os cantos à casa. E eis que rebenta um motim e devido a uma série de azares Juan fica do lado de dentro das grades, tendo que se fazer passar por um vulgar prisioneiro para se safar.

'Cela 211' é uma curiosa variação do 'filme de prisão': mantendo as coordenadas do género (denunciar as más condições dos detidos, jogar com as tensões entre detidos e guardas, mas também entre detidos, explorando este microcosmos violento e com regras próprias) tem também uma discreta mas forte componente politica. É que os reféns que os detidos usam para negociar com as autoridades são outros detidos, mas com uma peculiaridade: são membros da ETA - e é impressionante ver o trabalho a que se dá o governo, envolvendo-se directamente nas negociações, para que nada aconteça aos etarras, o que poderia criar embaraços políticos, nomeadamente com as autoridades bascas. Em duas pinceladas é-nos dado um excelente retrato do peso que a questão basca tem na sociedade espanhola.

Até ao minuto 78 'Cela 211' é um filme magnífico, que mantém o espectador sob tensão como há muito não se via. Uma realização ágil e imaginativa (mas não exibicionista) e dois grandes actores, criam um ambiente permanente de claustrofobia e alta voltagem. Mas, nesse minuto, que despoleta a revolta de Juan e determina definitivamente a sua transformação (e talvez seja este o principal tema do filme: como circunstâncias extremas podem alterar a natureza humana), há na minha opinião uma incongruência grave do argumento [atenção, spoiler: se quiser passe ao parágrafo seguinte]: é quando comunicam a Juan que a sua mulher morreu, sendo que o guarda que provocou a sua morte está dentro do recinto dos revoltosos. Parece-me muito pouco crível que isto fosse possível, mesmo nas circunstâncias apresentadas no filme (Juan está a pressionar fortemente os negociadores para falar com a mulher).

Talvez por a 'suspensão da descrença' estar algo abalada, nos momentos seguintes pareceu-me que o filme tremeu um pouco: o discurso de Juan perante o enviado do governo parece algo inflamado e demagógico de mais, mas ainda assim pode-se justificar com o estado alterado em que ele se encontra.

Felizmente após este desequilíbrio momentâneo Daniel Monzón rapidamente retoma as rédeas e o filme acaba como merecia: sem concessões. Tudo ponderado, é uma muito boa surpresa.

Celda 211, Espanha/França, 2010. Realização: Daniel Monzón. Com: Luis Tosar, Alberto Ammann, Antonio Resines, Manuel Morón, Carlos Bardem, Marta Etura, Luis Zahera.

6.12.10

O Americano


Pode um filme passado numa terrinha italiana bela como só as terrinhas italianas o podem ser, com o actor mais cool da actualidade, com uma actriz com a sensualidade de Violante Placido e um argumento que se insere na nobre linhagem do 'assassino contratado solitário e lacónico, com pinta para dar e vender' ser tão aborrecido quanto previsível? Pode. Amaldiçoemos Mr.Corbjin pelo facto.

The American, E.U.A., 2010. Realização: Anton Corbjin. Com: George Clooney, Violante Placido, Thekla Reuten, Paolo Bonacelli, Johan Leysen, Filippo Timi, Irina Björklund.

26.11.10

Machete


'Machete' é um belo divertimento desmiolado, mas... faltam-lhe os diálogos de Tarantino. Assim, o sabor a déjà vu é inevitável.

Machete, E.U.A., 2010. Realização: Robert Rodriguez e Ethan Maniquis. Com: Danny Trejo, Robert De Niro, Jessica Alba, Steven Seagal, Michelle Rodriguez, Jeff Fahey, Cheech Marin, Don Johnson, Lindsay Lohan.

25.11.10

José e Pilar


Exceptuando o facto ridículo de se legendar tudo o que é dito neste filme, o que inclui o muito que é dito em português, de um modo geral pode-se dizer que o principal mérito de Miguel Gonçalves Mendes é também a sua maior fraqueza: não inventa. Através de uma montagem inteligente mas 'neutra', acompanhamos o dia a dia de Saramago  (o Saramago pós-Pilar, como é dito, daí a justeza do título), as inúmeras solicitações a que tem que corresponder, as viagens, as feiras, a vida de estrela em que o Nobel o tornou, em suma.

E o que vemos é uma pessoa inteligente, pessimista, com um sentido de humor inesperado, ora feroz ora terna, mas sempre interessante.

É suficiente? Eu diria que depende do espectador. Eu gostaria de algo mais. Não digo que estejamos ao nível do 'telefilme de qualidade', mas não estamos muitos degraus acima.

José e Pilar, Portugal/Espanha/Brasil, 2010. Realização: Miguel Gonçalves Mendes. Documentário.

23.11.10

Lola


Há filmes que nos agarram desde o início. E há outros em que se passa o contrário. Não obstante as minhas elevadas expectativas, ao fim de 5 minutos eu já sentira que este não seria um dos 'meus' filmes. E não foi, e nem sei bem porquê. Tem duas fantásticas actrizes (as avozinhas, ou 'lolas') e atrás da câmara está um verdadeiro cineasta, com um olhar próprio, que nos dá um retrato impressivo de uma Manila pobre, alagada, injusta, em que cada um faz o que pode para se safar. Mas se admirei tudo isto, a verdade é que a maior parte do tempo não criei empatia com o filme. Talvez porque o cineasta force a nota em duas ou três cenas (estou-me a lembrar daquela em que uma das avós não consegue encontrar uma casa de banho); talvez porque o final me pareça mal explicado; ou talvez seja de mim. Há filmes assim: uma pessoa gostava de gostar mais deles. 

Lola, França/Filipinas, 2009. Realização: Brillante Mendoza. Com: Anita Linda, Rustica Carpio, Tanya Gomez, Jhong Hilario, Ketchup Eusebio.

18.11.10

Cópia certificada


Pode uma cópia ser superior ao original? E pode uma relação ser hoje o que foi há 15 anos? E pode um casal recriar o que se passou então?

‘Cópia certificada’ começa como uma reflexão sobre a arte (o seu protagonista defende as cópias como forma de arte), mas às tantas já se transformou na discussão de um casal acerca do seu casamento. E nós nem demos bem conta dessa passagem. E de repente já fomos confundidos sobre o que é verdadeiro neste filme. É o casal da 'primeira metade' ou da 'segunda'? Se é que se pode falar de 'verdade' quando estamos a falar de um filme, claro.

Este é o primeiro filme de Kiarostami feito fora do Irão (passa-se na Toscânia), com actores ocidentais (os extraordinários William Shimell (*) e Juliette Binoche), mas, está bem de ver, é até à medula um filme do realizador de ‘Close Up’ (filme em que, recordemos, um impostor que na vida real se fazia passar pelo realizador Mohsen Makhmalbaf, faz de si próprio na reprodução dessa fraude...).

'Cópia certificada' começa por nos provocar um sorriso (uma 'conferência' sobre arte, uma bela mulher a admirar o conferencista), depois parece que emperra (é certamente o filme mais palavroso de Kiarostami), a seguir baralha e torna  a dar e, no final, o resultado é o mesmo de sempre com Kiarostami: saímos fascinados.

(*) Ignorância minha: não é actor 'profissional', mas sim um reputado barítono.

Copie Conforme, E.U.A., 2010. Realização: Abbas Kiarostami. Com: Juliette Binoche, William Shimell, Jean-Claude Carrière, Agathe Natanson, Gianna Giachetti.

15.11.10

Arrependimentos


Mathieu (interpretado pelo actor e realizador Yvan Attal) é um arquitecto que vive em Paris, casado, bem instalado, que regressa à terrinha devido a doença da mãe, e encontra a namorada que abandonara 15 anos antes.

'Arrependimentos' é um filme sobre duas pessoas que não podem viver uma com a outra nem uma sem a outra - é um filme sobre obsessões.

Cédric Kahn já andou por estes terrenos - e com mais pertinência - em 'O tédio', mas é sempre um prazer voltar a este seu cinema elegantemente filmado, a estas suas personagens tão burguesas e tão francesas. E, claro, rever Valeria Bruni Tedeschi, actriz que combina como nenhuma outra sensualidade com um certo ar desamparado - vale sempre a pena sair de casa para a ver.

Les Regrets, França, 2009. Realização: Cédric Kahn. Com: Yvan Attal, Valeria Bruni Tedeschi, Arly Jover, Philippe Katerine, François Négret.

10.11.10

A rede social


Diga-se desde já que a 'A rede social' é uma competente, bem filmada e melhor interpretada biografia de Mark Zuckerberg (o - será preciso dize-lo? - quase-adolescente criador do Facebook).

Ao contrário das biografias escritas, com nobre tradição no mundo anglo-saxónico, os biopic fazem qualquer cinéfilo torcer o nariz de desconfiança. Mas neste caso havia à partida dois chamarizes: Fincher (não que eu seja um big fan, mas a verdade é que nunca fez um mau filme) e, claro, para os milhões de utilizadores do Facebook, potencial matéria-prima inflamável. Especificando: aquela explosiva combinação tipicamente americana do nerd que se revela também um ás imparável dos negócios -  capaz de se rodear dos melhores (cf. Sean Parker, o inventor do Napster, outro pequeno génio a que faltou de todo o quase ascetismo de Zuckerberg para ter o sucesso deste, mas que lhe deu uma valente ajuda - não por acaso é a única pessoa que vemos Mark admirar), mas também de se livrar sem escrúpulos de quem já não faz falta (cf. Eduardo Saverin, o brasileiro que entrou com o capital inicial mas que faz figura de corno o tempo todo na fita; ou, fica nas entrelinhas, o próprio Sean quando se torna um embaraço).

A cena inicial de 'A rede social' limitou, no entanto, desde o principio, a minha adesão ao filme.  É que resume desde logo o programa do que vamos ver, numa única conversa: o nerd-géniozinho-que-vai-inventar-a-rede-social-de-maior-sucesso-porque-tem-dificuldade-em-socializar-e-alguns-complexos-de-classe. Não era necessário munirem-nos logo ali com a chave freudiana adequada para descodificar a coisa. E a última cena do filme volta a bater no ceguinho do simbolismo berrante.

Mas reconheço que a adesão a qualquer biografia também passa em boa dose pelo nosso interesse no biografado, e uma pessoa que nem conta tem no Facebook, como eu, não será a que se sentirá mais fascinada por Mr.Zuckerberg. Perguntar-me-ão: mas o filme não é mais do que isso? Não transcende a tal biografia competente de Zuckerberg? Não me parece. Não estamos perante um novo Citizen Kane. Nem nada que se pareça.

The Social Network, E.U.A., 2010. Realização: David Fincher. Com: Jesse Eisenberg, Andrew Garfield, Justin Timberlake, Joseph Mazzello, Armie Hammer, Max Minghella, Rooney Mara, Brenda Song.

3.11.10

[Rec] 2


Mais do mesmo. Ou melhor: menos do mesmo, que a frescura inicial já se foi. Não havia necessidade.

[Rec] 2, Espanha, 2009. Realização: Jaume Balagueró e Paco Plaza. Com: Jonathan Mellor, Óscar Sánchez Zafra, Ariel Casas, Alejandro Casaseca, Pablo Rosso, Manuela Velasco.

26.10.10

O refúgio


Mais do que nunca chegar a lado nenhum, parece-me que este filme nunca chega a arrancar.

Mousse descobre que está grávida no hospital onde recupera de uma overdose. E resolve levar a gravidez avante, contra a opinião da família (rica, snob) de Louis, seu namorado e pai da criança, que ao contrário dela não sobreviveu a uma overdose de heroína.

Mousse refugia-se numa casa de campo (dum ex-amante?), onde aparece entretanto o irmão mais novo de Louis - apesar de, tal como a restante família, só a ter conhecido no funeral.

C’est tout. Até ao final, previsível, a rapariga alheada e indomável e o rapaz algo perdido tornam-se amigos.

‘O refúgio’ tem 1h20, dois belos actores, e um realizador que sabe filmar – por isso nunca nos aborrece. Mas é inegavelmente um Ozon menor e provavelmente o filme mais indistinto do realizador francês.

Le Refuge, E.U.A, 2009. Realização: François Ozon. Com: Isabelle Carré, Louis-Ronan Choisy, Pierre Louis-Calixte, Melvil Poupaud, Claire Vernet.

19.10.10

A Cidade


Nesta sua segunda longa-metragem atrás das câmaras, Ben Aflleck volta aos arredores de Boston onde cresceu. Affleck adapta agora uma novela de Chuck Hogan, depois de no seu filme inaugural ter adaptado Dennis Lehane, de quem Clint Eastwood filmou 'Mystic River'.

E também aqui há algo de eastwoodiano. Não que Affleck tenha unhas para poder ser comparado - nem como actor nem como realizador - com Eastwood, mas no sentido em que este é o tipo de argumento que imaginamos Clint a filmar.

Doug MacRay/Affleck é um assaltante de bancos e de carrinhas de tranporte de dinheiro, que segue as pisadas do seu pai que se encontra preso há longos anos. Doug teve a hipótese de ter uma vida diferente - chegou aos drafts de hóquei em gelo - mas o seu feitio violento, a tradição, o trauma provocado por uma mãe que o abandonou em miúdo, tudo contribuiu para que seguisse o destino espectável de quem nasceu num bairro de gangsters. O pai, a antiga namorada, o gang, o bairro, a cidade, tudo faz parte de uma grande teia familiar da qual Doug não consegue escapar ileso.

'A Cidade' é um thriller que se move algures entre o heist movie (com vários golpes e violência e mortandade em doses fartas) e o melodrama. O realizador Affleck tem olho para as cenas de acção e é capaz de manter o espectador sob tensão, mas tem mão pesada para o lado mais íntimo. A cena em que o actor Affleck descreve - com o olhar enviesado - à mulher por quem se apaixonou (a triste mas luminosa Rebecca Hall) o dia em que a mãe o deixou, demonstra uma subtileza e capacidade interpretativa dignas de um Stallone nos seus piores momentos.

Apesar de tudo, mesmo o filme ficando aquém do que podia e prometia, é ainda um thriller competente e acima da actual média hollywoodiana, e Affleck mantém os seus créditos como realizador. A ver vamos como os gastará no futuro.

The Town, E.U.A., 2010. Realização: Ben Affleck. Com: Ben Affleck, Rebecca Hall, Jon Hamm, Jeremy Renner, Blake Lively, Slaine, Owen Burke, Titus Welliver, Pete Postlethwaite, Chris Cooper.

14.10.10

O Pai das Minhas Filhas


Grégoire Canvel é um produtor de cinema independente assolado por dividas, com um catálogo de prestigio mas sem valor comercial, cujo último projecto, realizado por um realizador sueco megalómano e intratável, mas que ele considera um artista, o está a afundar de vez.

Inspirando-se no caso real do produtor francês Humbert Balsan (um dos últimos filmes que produziu foi 'Manderlay', o que torna impossível não associarmos o tal realizador sueco do filme a Von Trier...), Mia Hansen-Løve dá-nos o retrato de um homem triste e acossado, que às tantas desiste.

A realizadora (mulher de Olivier Assayas, já agora) filma com melancolia e elegância, mas falta convicção ao filme. Nunca conhecemos o homem charmoso e forte que uma personagem recorda, que teimou em produzir cinema independente durante 20 anos, o que nos leva a não sentirmos ou compreendermos a sua fase final - só vemos o homem já derrotado.

Além disso, o filme perde-se ao querer enquadrar o homem na sua vida pessoal, além da profissional: a segunda metade gira à volta da mulher que tenta salvar o seu legado e da filha adolescente que vai descobrindo um pai desconhecido, mas não se chega verdadeiramente a lado nenhum. O retato de Canvel permanece superficial, a sua mulher não ganha nunca consistência e apenas Alice Gautier, a brava adolescente a quem estão a acontecer muitas coisas, permanece na nossa memória.

Le Père de Mes Enfants, E.U.A./Canadá, 2010. Realização: Mia Hansen-Løve. Com: Louis-Do de Lencquesaing, Chiara Caselli, Alice de Lencquesaing, Alice Gautier, Manelle Driss, Eric Elmosnino.

8.10.10

Daybreakers — O Último Vampiro


Estamos em 2019, os vampiros são a maioria da população da terra e deparam-se com um problema vital: a escassez de sangue. Os humanos, a principal fonte de sangue, estão reduzidos a uns milhares de pessoas que se escondem como podem dos exércitos de vampiros caçadores. Há racionalização de sangue (só 5% numa chávena de café, por exemplo), nas ruas as pessoas (perdão, os vampiros, que agora são os 'normais')  começam a amotinar-se e há vampiros que não resistem a alimentar-se do sangue de outros vampiros, o que os torna numa espécie de morcegos zombies que atacam tudo e todos semeando o pânico nas populações. Entretanto, as grandes corporações fornecedoras de sangue – mormente a Bromley Marks chefiada por Sam Neil - tentam sintetizar um sangue substituto que resolva o problema…

Este argumento – que parte de uma grande ideia, mesmo sem forçarmos analogias do género sangue/petróleo – prova que é possível fazer filmes de vampiros que vão para lá de amores adolescentes ao crepúsculo (tal como ‘30 dias de escuridão’ era outro bom exemplo de uma grande ideia).

Mas, infelizmente, não é bem desenvolvido. Não obstante uma bela fotografia estilizada, a fazer lembrar uma graphic novel, um sólido naipe de actores principais (Ethan Hawke, Willem Dafoe, Sam Neil; os secundários australianos, sinceramente, pareceram-me pouco convincentes), e um par de bons pormenores (os carros com modo de condução diurna; os vampiros sempre a fumar - afinal são imortais...), o filme rapidamente se torna previsível e as personagens não ganham espessura, raramente ultrapassando o cliché. Se Ethan Hawke ainda defende bem o seu hematologista com problemas de consciência, a personagem do seu irmão (Michael Dorman), um soldado caçador de humanos, pouco mais é que papelão reciclado e nunca a (pretensamente) complexa relação entre os dois é convincente. Tal como não o é a relação de Sam Neil com a sua filha foragida (ainda humana). Ou a de Hawke com a líder rebelde dos humanos (Claudia Karvan). Tudo fica pela rama e é pena.

Por várias vezes os frios tons metálicos e azuis com que é filmada a Bromley Marks me fez lembrar os ambientes de 'Gattaca', com o mesmo Ethan Hawke, que era aquilo que este 'Daybreakers' poderia facilmente ser mas não consegue: um bom sci-fi de culto. Assim permanece apenas um filme com um certo interesse para fãs de fantástico, que apesar de tudo ficarão com um olho nos irmãos Michael e Peter Spierig, os australianos que o escreveram e realizaram.

Daybreakers, Austrália/E.U.A., 2009. Realização: The Spierig Brothers. Com: Ethan Hawke, Willem Dafoe, Sam Neill, Claudia Karvan, Michael Dorman, Isabel Lucas.

7.10.10

Meu filho, olha o que fizeste!


'Meu filho, olha o que fizeste!' (que na ‘tradução’ portuguesa parece o titulo de uma comédia foleira) foi o segundo filme de Werner Herzog a estrear nas salas portuguesas este ano, depois de ‘O polícia sem lei’ (são ambos de 2009). Embora nem sempre estreiem por cá, entre documentários e obras de ficção (e o alemão é um dos realizadores em que estes dois géneros mais se interligam e comunicam) Herzog mantém um ritmo imbatível de praticamente um ou dois filmes por ano há quase 4 décadas.

Ao contrário de ‘Polícia sem lei’, este filme (tal como ‘Rescue Dawn’ há uns anos) passou por cá praticamente despercebido. Numa das raras coisas que me lembro de ler sobre ele, dizia-se que seria uma espécie de Lynch em segunda mão (provavelmente por David Lynch ser produtor do filme e por haver uma cena com um anão). Mas não é. 'Meu filho, olha o que fizeste!' é Herzog até à medula.

Os planos são de Herzog; a utilização da banda sonora é de Herzog (atente-se numas cenas em que as imagens se suspendem, dando o primeiro plano à banda sonora – uma canção de Chavela Vargas, por exemplo – que parecem directamente saídas de um ‘Fata Morgana’); e, claro, Brad McCullum (Michael Shannon), o lunático possuído por uma ‘voz interior’, faz parte de uma longa galeria herzoguiana que inclui Aguirre, Fitzcarraldo, Cobra Verde ou Timothy Treadwell.

É certo que Michael Shannon, apesar de excelente actor e ter certa tendência para personagens alucinadas (lembremo-nos de 'Bug', por exemplo), não é Klaus Kinski (Christian Bale, outro grande actor, também se ressentia desse fantasma), e falta à sua personagem aquele tom épico de louco visionário que Kinski tinha nos genes – talvez, também, por haver um excessivo enfase ‘freudiano’  no facto de a sua progressiva loucura emergir da possessiva relação que tem com a mãe, e que o leva a viver intensamente as tragédias gregas, nomeadamente a 'Oresteia'.

Mas, ainda assim, mesmo que o filme possa ser acusado de ser uma variação em tom menor dos grandes Herzogs (e todos os grandes realizadores - pelo menos em vida - acabam por ser acusados de andarem sempre a fazer o mesmo), aquele fascínio que quase todos os filmes do realizador alemão – um dos grandes realizadores em actividade, insistamos– nos incutem, está sem dúvida presente. O que por si só é mais do que suficiente para incluir ‘Meu filho, olha o que fizeste!‘ entre as mais interessantes estreias do ano.

My Son, My Son, What Have Ye Done, E.U.A./Alemanha, 2009. Realização: Werner Herzog. Com: Willem Dafoe, Chloe Sevigny, Michael Shannon, Brad Dourif, Anthony Mackie, Michael Peña.

28.9.10

A Dança — Le Ballet de l´Ópera de Paris


Frederick Wiseman – que muito boa gente considera o maior documentarista em actividade - tem 80 anos e quase 40 filmes realizados em mais de trinta anos de carreira, mas este - de 2009 - é o seu primeiro filme a estrear em Portugal. Como o título indica é um filme sobre dança e mais especificamente sobre o muito reputado Ballet de l'Ópera de Paris.

Não há aqui depoimentos, entrevistas, legendas de imagens, ou algo no género. O método de Wiseman é deixar a câmara falar. A câmara anda por lá, por toda a parte, e depois a montagem faz o resto (130 horas de filmagem reduzidas na mesa de montagem a 2h30).

Durante a fase inicial o filme centra-se essencialmente nos ensaios de vários ballets do reportório da companhia. Aí vemos o rigor e trabalho exigidos, mesmo estando a falar de bailarinos créme de la crème. Vemos indicações de coreógrafos, diálogos (num deles coreógrafo e bailarino falam em ‘X-Man’ e ‘Eduardo mãos de tesoura’ para precisar o que pretendem), comentários, muitas vezes humorísticos (componente intrínseca a Wiseman) de quem assiste. Mais para o fim a câmara detém-se principalmente no resultado final, dando-nos belíssimas sequências de espectáculos da companhia, parecendo-nos estar quase a ver um musical.

Pelo meio, em breves apontamentos, vamos vendo o que é necessário para o funcionamento do Ballet, o que está por trás da dança. A directora artística Brigitte Lefèvre explica a um coreógrafo a forte hierarquia existente entre bailarinas; numa reunião da administração discute-se uma recepção aos mecenas americanos (incluindo representantes do recém falido Lehman Brothers… já falámos do humor de Wiseman); assistimos a parte de uma sessão de esclarecimento sobre as novas leis laborais da função pública francesa; é-nos dado um plano duma costureira; ou dum caiador; ou da cantina; ou de um apicultor que cria abelhas no telhado do imponente Palais Garnier, sede da companhia; ou das catacumbas do palácio.

Sabiamente, com um ritmo e fluidez impecáveis, Wiseman vai-nos integrando no Ballet, fazendo-nos perceber a sua estrutura laboral, as suas dificuldades, o seu modo de funcionamento, tudo o que é necessário para o espectáculo funcionar, mostrando-nos simultaneamente o espectáculo, deslumbrando mesmo o espectador mais distante do meio (como eu).

Wiseman só estreou em Portugal com mais de 30 anos de atraso? Pois nunca é tarde de mais para ter uma lição de cinema deste calibre.

La Danse – Le Ballet de l`Opéra de Paris, França/E.U.A., 2009. Realização: Frederick Wiseman. Documentário.

24.9.10

Depois da vida


- Anna (Christina Ricci), deitada na morgue : 'Eu não estou morta!'
- Eliot (Liam Neeson), o homem da funerária: 'É o que todos dizem...'

'Depois da Vida' é um filme fantástico, subgénero 'sobrenatural', daqueles que é mais normal apanhar num Fantasporto que nas salas 'comerciais'. Distingue-se um pouco pelas suas pretensões filosóficas - que não vão muito além do 'já estavas morta em vida' ou 'as pessoas acham que têm medo da morte, mas têm mais da vida' - e pela seráfica fotografia de Anastas Michos e elegante realização de Agnieszka Wojtowicz-Vosloo. Mas o seu verdadeiro trunfo é Christina Ricci - que está para o magrinho, mas muito bela - que domina todo o filme no papel da melancólica, triste e fantasmagórica Anna. Só por ela o preço do bilhete já é bem empregue.

After.Life, E.U.A., 2009. Realização: Agnieszka Wojtowicz-Vosloo. Com: Christina Ricci, Liam Neeson, Justin Long, Chandler Canterbury, Celia Weston, Josh Charles.

17.9.10

Até ao inferno


A premissa deste filme não podia ser mais actual: Christine (Alison Lohman) é uma bancária que recusa o prolongamento de um empréstimo a uma cigana e assim o banco hipoteca-lhe a casa. Christine até é boa rapariga e quer ajudar a velhinha, mas o “sistema” só olha para números (e ela está pressionada para obter um lugar de vice-directora) e não lhe deixa outra opção. Quem não gosta nada da decisão é a cigana, que amaldiçoa a pobre rapariga.

A partir daqui Sam Raimi maneja, se não com muita originalidade, com eficácia q.b., todos os códigos do filme de terror espírito série B, dando-nos duas mãos cheias de cenas aterrorizadoras, uma mão, digamos que ainda com os dedos quase todos, de cenas verdadeiramente nojentas, e não esquece ainda uma pitada de humor (negro).

Um regresso correcto de Raimi aos velhos tempos de ‘The Evil Dead’, depois ter andado a ganhar a vida com o franshising ‘Homem Aranha’.

Drag Me to Hell, E.U.A., 2010. Realização: Sam Raimi. Com: Alison Lohman, Justin Long, Lorna Raver, Dileep Rao, David Paymer.