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4.7.07

As tartarugas também voam



Devido às diatribes da distribuição portuguesa, quase que perdi este filme, que foi lançado às feras no final de 2006 (28 de Dezembro, segundo o Cinema 2000), e passou fugazmente pelo Porto já em Maio. Uma vez mais, foram os 'Filmes de culto' que me salvaram. E seria um crime perde-lo: 'As tartarugas também voam' é um pequeno milagre.
É um olhar sobre um campo de refugiados na fronteira iraquiana, visto através de 'Parabólica', o negociante faz-tudo lá do sítio (é assim uma espécie de versão simpática e adolescente do Sefton de 'Stalag 17'), que comanda um exército de miúdos que apanham minas, a moeda de troca para tudo: parabólicas (para ouvir as noticias da guerra nos canais estrangeiros), armas, máscaras de protecção, até um colar para oferecer quando se apaixona. 'As tartarugas também voam' tem momentos terríveis, mas em momento algum dispensa o sentido de humor (uma lição que Bahman Ghobadi poderá ter aprendido com Billy Wilder), nem perde de vista um humanismo bravo e simples, que nos faz lembrar os melhores momentos do neo-realismo italiano. Não há aqui santos (embora o fantástico miúdo sem braços que tem premonições se aproxime bastante), mas sim pessoas muito, muito humanas, desde 'Parabólica' à impressionante miúda por quem se apaixona.
O filme é de 2005 e, como já disse, estreou cá em 2006, mas é desde já o meu filme de 2007.
Lakposhtha hâm parvaz mikonand /Turtles Can Fly, Irão/Iraque/França, 2005. Realização: Bahman Ghobadi. Com: Soran Ebrahim, Hirsh Feyssal, Avaz Latif, Saddam Hossein Feysal, Abdol Rahman Karim.

30.1.07

O terceiro passo



Algures neste filme sobre a rivalidade mortal entre dois mágicos, um deles elogia um truque do outro pela sua simplicidade. Infelizmente Nolan não ouviu a sua personagem: ‘The prestige’ é todo baseado num argumento rebuscado que tenta estar sempre um ou dois passos à frente do espectador, que tenta impressioná-lo com piruetas cada vez mais elaboradas, com uma montagem vistosa que anda para trás e para a frente, com uma produção luxuosa, com um cast imponente (até David Bowie faz uma perninha). Infelizmente por trás de todo este aparato não há grande coisa para mostrar: é como um mágico que montasse um número com grandes meios e uma encenação sumptuosa, para no final sair a habitual pomba debaixo do lenço. Nolan já não se deve lembrar de ‘Memento’, que era um filme muito interessante por se basear, por trás da sua aparente complexidade, numa ideia muito simples: filmar a história ‘da frente para trás’. Mas definitivamente esses tempos já lá vão, e de filme para filme o realizador vai diluindo a sua personalidade na máquina industrial. É uma pena sempre que se perde um autor.
The Prestige, E.U.A., 2006. Realização: Cristopher Nolan. Com: Hugh Jackman, Christian Bale, Michael Caine, Scarlett Johansson, David Bowie, Andy Serkis, Rebecca Hall, Piper Perabo.

18.1.07

Aos doze e tantos



Neste início de ano ando a ver mais filmes que me escaparam o ano passado, que estreias de 2007. Para já, uma boa surpresa: este 'aos doze e tantos', segundo filme de Michael Cuesta e que passou por cá algo despercebido.
É assim uma espécie de cruzamento entre 'Magnolia' e 'Mean Creek', não atingindo o nível do primeiro, mas sendo muito melhor que o segundo. Entra pelo dia a dia de três pré-adolescentes, a quem a morte de um amigo (e irmão, num dos casos) acaba por mudar definitivamente. O que o filme capta tão bem são os seus problemas, simultaneamente tão comuns aos dos adultos (o não saber lidar com a diferença; as obsessões; até a solidão) e tão diferentes (ainda não sabem que as coisas não dependem apenas da nossa vontade). É neste sentido que referi 'Magnolia': o filme fala da vida de todos nós, da frágil teia que construimos e que se chama sociedade, mas põe no seu centro miúdos e não adultos.
Definitivamente, depois dos bons indícios dados em 'L.I.E.', Michael Cuesta confirma que é um realizador a ter em atenção.
Twelve and holding, E.U.A., 2005. Realização: Michael Cuesta. Com: Conor Donovan, Zoe Weizenbaum, Jesse Camacho, Jeremy Renner, Michael C. Fuchs, Joseph Foster, Annabella Sciorra

12.1.07

Sonhar com Xangai



Penso que foi Stendhal quem disse que os actos banais do quotidiano se tornam relevantes se tiverem lugar numa época histórica especial. Lembrei-me desta 'máxima' ao ver este filme. Aqui se conta o dia a dia de Qing Hong, uma adolescente como outra qualquer: as suas prioridades são sair à noite com as amigas, experimentar uns sapatos de salto alto, namoriscar. E, claro, colidem com as do pai: este quer que ela estude para entrar na universidade e sair da aldeola onde vivem. Aliás ele próprio quer regressar para Xangai, donde veio há vinte anos atrás para trabalhar numa fábrica, na sequência de um programa governamental.
As angustias e divertimentos de Qing Hong tornam-se relevantes por espelharem o clima de abertura que se respirava na China dos anos 80, na sequência das reformas promovidas por Deng Xiaoping. Os jovens usam calças à boca de sino, ouvem rock and roll, organizam-se em gangs, vão a festas clandestinas. Quase nos esquecemos que estamos na China comunista e não numa qualquer cidadezita de qualquer outro país. Só nos lembramos quando na escola proíbem as calças à boca de sino; ou quando na fábrica do pai de Qing Hong, não o deixam partir; ou, claro, quando passa pelas ruas um carro com um altifalante a anunciar...as execuções que vão ter lugar nesse dia!
'Sonhar com Xangai' torna-se assim um filme interessante nesta atenção 'realista' que dá aos pequenos ventos de mudança que iam soprando por essa época (e que iriam culminar meia dúzia de anos depois em Tiananmen), embora não ultrapasse a mediania competente a nível cinematográfico.
Sem deslumbrar, é ainda assim uma boa alternativa à dieta hollywoodiana que nos vai sendo quase exclusivamente servida...
Qing Hong / Shanghai Dreams, China, 2005. Realização: Wang Xiaoshuai. Com: Gao Yuanyuan, Li Bin, Yan Anlian, Wang Xueyang e Qing Hao.

8.1.07

Babel



'Babel' sofre de um pecado original: sendo um filme político, a parte política é a menos interessante. As autoridades (americanas, claro) são sempre autoritárias, insensíveis e arrogantes - neste campo é tudo maniqueísta e bastante irritante. Basta isto para anular o interesse do filme? Eu penso que não. 'Babel' tem tantas qualidades como tem defeitos, e estes até só se manifestam lá para o final do filme. Felizmente o que fica no meio não é um mero pretexto para as tais conclusões políticas, ou se o é consegue estar para lá disso. Iñárritu é um bom contador de histórias, de histórias humanas, de seres humanos de carne e osso, sejam adolescentes surdas-mudas que moram numa Tóquio futurista e pop (e que talvez simbolize como nenhuma outra metrópole os valores do capitalismo 'ocidental'), sejam miúdos perdidos nos montes marroquinos. Tirando Brad Pitt e Cate Blanchett, que são pouco mais que bonecos, gostei das outras personagens, gostei do 'segmento Tóquio', gostei do 'segmento México' até aos incidentes 'políticos' da fronteira, gostei do 'segmento Marrocos', até à parte 'política' do tiroteio com a polícia. Não é por acaso que o melhor filme de Iñárritu continua a ser 'Amor Cão': aí não há grandes pretensões filosóficas (como no dispensável '21 gramas'), nem políticas (como aqui), mas apenas vontade de contar histórias do quotidiano, à maneira de alguma tradição contista americana. Quanto ao resto, o realizador mexicano filma muito bem (mesmo algumas partes filmadas a la teledisco em Tóquio fazem sentido), e domina na perfeição a técnica das histórias entrelaçadas, que noutros realizadores já cansa (veja-se o caso de 'Crash').
Seja como for, o facto de partir como grande favorito à corrida dos Oscares, não deixa de revelar algum masoquismo por parte da academia americana...
Babel, E.U.A., 2006. Realização: Alejandro González Iñárritu. Com: Brad Pitt, Cate Blanchett, Gael García Bernal, Adriana Barraza, Boubker Ait El Caid, Tarchani Said, Rinko Kikuchi, Kôji Yakusho, Elle Fanning, Nathan Gamble.