Quase no final do filme, Isabel II desabafa algo do género: 'eles querem glamour, lágrimas e espectáculo - mas eu fui educada a manter os meus sentimentos em privado'. Eles são o povo, claro. O seu povo, que ela deixou de reconhecer após o modo histérico e irracional com que reagiu à morte da Princesa Diana. Pelo contrário, quem estava preparadíssimo para lidar com este novo mundo era o jovem recém-empossado primeiro-ministro Tony Blair. É o primeiro a saltar para a arena, fazendo o discurso fúnebre de Diana, com o famoso 'Princesa do povo' (cortesia do seu influente assessor Alastair Campbell). Fica horrorizado com a inabilidade (ou falta de vontade) da Rainha e dos seus conselheiros em lidar com os media e a opinião pública, e telefona-lhe angustiado a perguntar se já viu a última sondagem (pois...) sobre a monarquia. 'De onde veio esta gente!?' é o comentário que mais se ouve entre o entourage de Blair a propósito de Buckingham Palace.
Stephen Frears filma com placidez, proximidade e convicção estes dias em que algo mudou para sempre, dando-nos (com o contributo insubstituível de Helen Mirren) um magnífico retrato de Isabel II, fria e inteligente, que teve que engolir a seco um mundo onde não se revê. No seu mundo, a forma de lidar com os miudos após a morte da mãe, é envia-los à caça de veado na propriedade Escocesa de Balmoral. Quem também não fica mal na fotografia é Tony Blair, retratado como ambicioso, esperto, sempre atento à opinião pública, mas longe do político cínico e pragmático que se revelou ser. Tem mesmo algo de tocante o seu fascínio pela Rainha. A sua mulher diz-lhe que ele a põe no lugar da sua falecida mãe; ele defende-se dizendo que uma monarquia impopular também prejudicará o seu governo. Mas quem estará mais perto da verdade será Isabel II, que lhe diz: 'você defendeu-me quando eu estava na mó de baixo junto do povo, porque sabe que um dia lhe acontecerá o mesmo. Sem aviso e subitamente'.
The Queen, Grã-Bretanha/França/Itália, 2006. Realização: Stephen Frears. Com: Helen Mirren, Michael Sheen, James Cromwell, Alex Jennings, Helen McCrory, Sylvia Syms, Roger Allam, Tim McMullan.
2 comments:
Fui ver Sábado e gostei muito. Gosto da dicotomia de sentimentos, das formas de reagir, das consequências dessas reacções.
é um filme de certo modo estranho, não tão leve como parece à primeira vista.
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