'Babel' sofre de um pecado original: sendo um filme político, a parte política é a menos interessante. As autoridades (americanas, claro) são sempre autoritárias, insensíveis e arrogantes - neste campo é tudo maniqueísta e bastante irritante. Basta isto para anular o interesse do filme? Eu penso que não. 'Babel' tem tantas qualidades como tem defeitos, e estes até só se manifestam lá para o final do filme. Felizmente o que fica no meio não é um mero pretexto para as tais conclusões políticas, ou se o é consegue estar para lá disso. Iñárritu é um bom contador de histórias, de histórias humanas, de seres humanos de carne e osso, sejam adolescentes surdas-mudas que moram numa Tóquio futurista e pop (e que talvez simbolize como nenhuma outra metrópole os valores do capitalismo 'ocidental'), sejam miúdos perdidos nos montes marroquinos. Tirando Brad Pitt e Cate Blanchett, que são pouco mais que bonecos, gostei das outras personagens, gostei do 'segmento Tóquio', gostei do 'segmento México' até aos incidentes 'políticos' da fronteira, gostei do 'segmento Marrocos', até à parte 'política' do tiroteio com a polícia. Não é por acaso que o melhor filme de Iñárritu continua a ser 'Amor Cão': aí não há grandes pretensões filosóficas (como no dispensável '21 gramas'), nem políticas (como aqui), mas apenas vontade de contar histórias do quotidiano, à maneira de alguma tradição contista americana. Quanto ao resto, o realizador mexicano filma muito bem (mesmo algumas partes filmadas a la teledisco em Tóquio fazem sentido), e domina na perfeição a técnica das histórias entrelaçadas, que noutros realizadores já cansa (veja-se o caso de 'Crash').
Seja como for, o facto de partir como grande favorito à corrida dos Oscares, não deixa de revelar algum masoquismo por parte da academia americana...
Babel, E.U.A., 2006. Realização: Alejandro González Iñárritu. Com: Brad Pitt, Cate Blanchett, Gael García Bernal, Adriana Barraza, Boubker Ait El Caid, Tarchani Said, Rinko Kikuchi, Kôji Yakusho, Elle Fanning, Nathan Gamble.
4 comments:
Aquilo que neste filme minimamente me interessou foi o hiato entre uma montagem globalizadora (em todos os sentidos) e um conjunto de narrativas em que se mostram os espaços em branco da Globalização (quando nem uma ambulância há no meio do deserto...).
Mas reconheço que é uma obra irritante.
ainda bem que alguém gostou :)
Eu tb achei um bocado irritante e pouco surpreendente, está tudo à espera de como as coisas vao acabar... O q eu gostei mais foi do casamento mexicano.
É a vantagem dos filmes com 'segmentos': há sempre algo de que podemos gostar ;) Eu também gostei do casamento mexicano e bastante de toda a história de Tóquio.
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