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7.8.07

Bug



'Bug' começa com um excelente travelling, em que temos uma panorâmica aérea que se vai afunilando até se centrar num motel no meio de nenhures. Descobrimos que mora aí Agnes (Ashley Judd), empregada num bar lésbico de uma terriola na América profunda, uma solitária que se mete nos copos e teme o regresso do ex-marido que vai sair da prisão.
Apesar de fugir de socializar, principalmente com homens, Agnes sente-se só e acaba por ser atraída por Peter (Michael Shannon, estranhamente parecido com Ray Liotta), um homem tranquilo, de poucas mas sensatas falas, confiante e seguro. Mesmo o que ela precisava como contraponto ao brutal e espalhafatoso ex. Peter parece ser capaz de meter este na ordem e parece que Agnes vai ter uma segunda oportunidade.
Mas, uma noite Peter acorda por causa de um insecto. Agnes não é capaz de o ver, mas este insiste e ela relutantemente acaba por ir na conversa. Depois Peter conta-lhe que o governo o persegue. Que é um ex-soldado e que fizeram experiências secretas nele. Entretanto a praga de insectos 'invisíveis' alastrou. Ele está todo marcado de os arrancar do corpo e ela (entretanto convertida) também. Os níveis de paranóia vão-se exponenciando.
Voltemos aqui ao plano inicial de que falámos. Compreendemos agora a vista aérea do motel como um símbolo de todo o filme, de tudo o que vai na cabeça de Peter (e depois da sugestionada Agnes), de que está a ser permanentemente vigiado por uma entidade superior (os militares, o governo), que lhe controlam todos os passos e toda a sua vida.
Enquanto mantém o espectador na dúvida, num certo limbo (Peter será mesmo um paranóico-esquizofrénico, ou haverá ali ago que...) o filme de Friedkin é magnífico. Quando passa para o lado da paranóia pura, alucinante, quanto a mim perde bastante força e a última meia hora é consideravelmente menos interessante. O que é sugerido é sempre bastante mais inquietante que o explicito.
Apesar de não poder deixar de pensar que passou ao lado de ser um grande filme, 'Bug' permanece, ainda assim, um dos mais insólitos objectos em cartaz. Pode ser visto, claro, como uma metáfora pós-11 de Setembro, sobre o mundo moderno, sobre o pânico do invisível, do que não controlamos (se virmos o filme do lado de Peter). Ou pura e simplesmente sobre a necessidade de as pessoas se agarrarem a algo, de qualquer coisa ser preferível à sua solidão e desamparo (se virmos o filme do lado de Agnes).
E a diferença que faz não ter um tarefeiro atrás da câmara! O modo como Friedkin (realizador de 'O exorcista' ou 'French Connection') domina o espaço, aquele quarto onde se passa 99% do enredo é de mestre. Quem sabe nunca esquece.
Bug, E.U.A., 2007. Realização: William Friedkin. Com: Ashley Judd, Michael Shannon, Lynn Collins, Brian F. O`Byrne, Harry Connick Jr..

3 comments:

Carlos Pereira said...

É um dos melhores filmes actualmente em cartaz. Claustrofóbico, inquietante, e com uma realização de mestre (que apresenta, como referes, um domínio total de um espaço onde a loucura (?) é pivotal).

Anonymous said...

O que é sugerido é sempre bastante mais inquietante que o explicito... é por isso que o filme peca já mais para o fim, quando nos esclarece que afinal não há insectos nenhuns (nunca os vimos, mas até aí interrogavamo-nos da sua existência ou não)...
No entanto, é uma realização de mestre e um trabalho de interpretação soberbo.

Andreia said...

não devo ser mesmo grande apreciadora de cinema... bocejei bastantes vezes no desenlace do filme.. ou não estava com paciencia para ver tanta loucura junta :)