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1.8.07

Comédias e provérbios


Sophie Renoir et François-Eric Gendron em L'ami de non amie

Andei a ver mais ou menos de enfiada todos os filmes de Rohmer da série 'Comédias e provérbios'. As personagens de Rohmer são as mais faladoras da história do cinema, mas enquanto em filmes como Ma nuit chez Maude dissertam sobre temas como a filosofia ou Deus, nesta série, talvez por serem quase todas muito novas, falam sobretudo sobre si próprias, das suas aspirações, da sua vidinha; sobre temas comezinhos em suma.

O que eu mais gosto nestes filmes é que as preocupações das suas personagens são preocupações iguais às que nós temos (ou já tivemos quando tínhamos 20 anos). Em La Femme de l'Aviateur, François encontra por acaso uma rapariga e pensa que encontrou a pessoa certa; no entanto, acaba por descobrir que ela tem um namorado. Em Le Beau Mariage, Sabine também pensa ter descoberto o seu 'amor à primeira vista', e decide imediatamente casar-se com ele; mas casar é a ultima ideia que passa pela cabeça dessa pessoa. Em Pauline à la Plage, Marion, apesar de avisada, apaixona-se por um playboy. Em Le Rayon Vert, Delphine sente-se frustrada porque não tem com quem ir de férias: a amiga com quem tinha combinado fazer uma viagem trocou-a pelo namorado; as restantes pessoas amigas têm família, namorados, a vida programada. Ela acaba por andar sozinha dum lado para o outro e aborrece-se de morte. Quando lhe perguntam, diz que sim, que tem namorado, e dá o nome do ex que ainda não esqueceu.

Finalmente os meus favoritos (seguidos de perto por Le Rayon Vert). Em Les Nuits de Pleine Lune, Louise depara-se com um outro problema comum: ela gosta muito de sair à noite, mas o namorado, com quem vive, detesta-o. Vivem nos arrabaldes, em casa dele, mas ela resolve recuperar o seu apartamento em Paris, podendo assim ficar a dormir lá depois das noitadas que gosta de fazer na capital. Geralmente sai acompanhada de um amigo noctívago, casado mas com uma atracção por ela, e que o namorado abomina. Sente-se ligada ao namorado, mas não suporta sentir-se presa, por isso não rejeita um encontro amoroso ocasional (mas não com o amigo, demasiadamente insistente). Ou seja, é uma rapariga 'moderna' e o namorado um 'bota de elástico'. Rohmer troca-lhe as voltas, e as coisas acabam por não lhe correr muito bem (de certo modo é um filme bastante reaccionário - a moral é algo do género 'ela estava mesmo a pedi-las'). L'Ami de Mon Amie é o mais difícil de resumir. O provérbio inicial é 'os amigos dos meus amigos meus amigos são' e gira à volta das relações entre casais e amigos, de alguém se interessar pelo/a namorado/a de uma amiga/o, ou de um amigo/a nosso se interessar pela mesma pessoa que nós.

O que sustenta estes filmes, com temas tão terra a terra como os que descrevemos, são então os magníficos diálogos, a maneira como Rohmer nos apresenta as suas palavrosas personagens, os seus burgueses irritantes, como já alguém, com razão, lhes chamou. É por isso que Rohmer se aguenta tão bem fora do grande ecrã, quer seja na escrita - veja-se a excelente 'versão' em livro dos Sete contos morais - quer seja em dvd. O que não quer dizer que não seja um grande realizador. E até um dos maiores.

PS: Estes filmes, em que ninguém terá mais de 30 anos e que são essencialmente sobre as preocupações de pessoas solteiras que procuram alguém, foram filmados entre 1981 e 1987; ou seja, Rohmer filmou-os entre os seus 61 e 67 anos, o que não deixa de ser admirável e surpreendente.

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