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24.3.08

A política dos autores



'Sim, mas a política dos autores tornou-se muito depressa uma fuga para a frente, porque era o mesmo que dizer: efectivamente são todos muito diferentes, mas têm algo em comum que é o facto de serem "autores". Mas bom, a partir desse momento, num instante, toda a gente se tornou um autor!'

Jacques Rivette, em diálogo com Hélène Frappat, in La Lettre du Cinéma (1999), transcrito no catálogo da Cinemateca dedicado ao cineasta.

Estas palavras de Rivette fazem eco com um pensamento que eu próprio já tive por diversas vezes: uma das 'manias' de alguma critica actual é descobrir um novo "Hitchcock", ou seja descobrir um autor num realizador que faça 'filmes de acção', que se afaste do conceito mais 'consensual' de autor.

Não falo assim de um Kiarostami ou mesmo de um Eastwood, que toda a gente concorda em classificar como tal. Eastwood até poderia ser o tal candidato, mas a estranha unanimidade que caiu sobre ele já o consagrou, e afastou a hipótese de ele ser o autor que o crítico descobriu e cujos filmes (todos eles) defenderá intransigentemente - hoje em dia crítico que se pretende crítico classifica de obra-prima o que quer que Mr.Eastwood faça e ponto final. Eastwood, como os clássicos, já não é discutível. Enquanto a crítica batia - e bem - em Scorsese enquanto ele andava a fazer Gangues de Nova Iorque e Aviadores, Eastwood é aplaudido de pé mesmo quando faz um filme tão desapontante como 'As bandeiras dos nossos pais' (não concordando com tudo, nomeadamente com o que é dito de 'Mystic River', parece-me que o que aqui é dito é bastante pertinente).

Mas adiante, que o meu post não se destina a Eastwood, grande realizador com alguns pontos baixos, tal como Scorsese de quem muito gosto. O meu ponto prende-se com aqueles que pretendem descobrir autores no horrível Stalone (só se for no mesmo sentido em que Ed Wood era um autor...) ou em John McTiernan, James Cameron, Michael Mann e sei lá em quem mais. Basta um fulano ser americano e fazer um bom filme 'de acção' dentro de Hollywood (um 'Assalto ao arranha céus' ou um 'Miami Vice', digamos) para se vir logo por aí abaixo a reavaliar a obra anterior do senhor e, lá está, agrafar-lhe o bendito título de 'autor'. Por este processo, um filme tão vulgar como 'Colateral', passa logo ao estatuto de obra-prima transcendente. E por vezes nem é preciso tanto: basta haver alguma auto-referencialidade e logo um 'Rocky 10' ou um 'Rambo 23', com Stalone a grunhir banalidades, passa a ser um filme 'crepuscular' e sei lá que mais. Irra!

4 comments:

Luís A. said...

Até estava a concordar com o que escreveste, mas quando cheguei à parte em que metes Michael Mann no mesmo saco que Stalonne, Cameron e Mctiernan, ou pior ainda, quando sugeres que ele não passa de um realizador de acção, creio que revelas algum desconhecimento da sua obra. Ou Thief, Manhunter, ou The Insider serão para ti meros filmes de acção? A sua mestria técnica, a poesia visual e a sua coerencia temática que vai de Jericho Mille (79) a Miami Vice (06) são algo de assombrante.

Fora esse aparte, concordo com a generalidade do teu texto.

um abraço

Unknown said...

Eu escrevi 'filmes de acção' assim mesmo, com aspas, penso que se percebe qual é a ideia.
Quanto a Michael Mann, é verdade que a sua obra, exceptuando 'Miami Vice', me interessa pouco. Mas é assim mesmo que eu gosto de ser rebatido, por alguém com conhecimento de causa e uma grande cinefilia.

Um abraço e aparece sempre.

Luís A. said...

Eu reparei nas aspas. Mas mesmo assim Madox...Stallone e Michael Mann no mesmo saco é que não! :)

um abraço cinéfilo

Unknown said...

Tens razão, o Michael Mann não merece isso.