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1.11.08

Diário de Blindness (I)



A sensivelmente duas semanas de estrear por cá 'Blindness', a adaptação para a tela que Fernando Meirelles fez de 'Ensaio sobre a cegueira' de Saramago, saiu oportunamente nas livrarias 'Diário de Blindness' (quasi edições), transcrição do blogue homónimo mantido pelo realizador brasileiro durante a rodagem do filme (embora esta origem não seja referida no livro - talvez o editor tenha tido medo de perder leitores em favor do blogue!).

Seja qual for o meio que o leitor escolha para ler este diário (para mim não há nada como o papel), não dará o seu tempo por mal empregue. Muito pelo contrário. Não sendo Meirelles um dos meus realizadores de eleição (gostei de 'O fiel jardineiro', mas o celebrado 'Cidade de Deus' deixou-me indiferente), a verdade é que este conjunto de notas (16 posts, apenas) são uma excelente abordagem ao oficio de realizador, escritas com humor, talento, humildade - que não exclui uma série de opiniões fortes e - não menos importante - num português (do Brasil, claro) muito agradável e legível.

Meirelles vai reflectindo livremente sobre os problemas que se lhe vão deparando, quer sejam artísticos (como adaptar um livro que ele considera uma obra-prima? Como não desiludir Saramago, 'uma figura um pouco intimidante', mas que lhe deu total confiança?), técnicos (que câmara usar? que cenário?) ou logísticos (em que cidade filmar esta cena?).

E muitos são uma combinação de factores de diversa natureza, claro. Como o facto de uma personagem ganhar mais importância em relação ao livro porque o seu actor assim o 'impôs', ou como ter que suavizar algo que é suportável no papel mas que não funciona em imagens.

Um exemplo: na rodagem de uma cena, Julianne Moore irrompe pelo cenário fora transbordando uma emoção fortíssima, mas apanhando toda a gente desprevenida, principalmente Mark Rufallo com quem contracenava. Donde teve que se repetir a cena. Mas a seguir era um microfone que não funcionava. Com tantas paragens e repetições, Julianne Moore já tinha perdido um pouco a emoção, mas tudo o resto já ia batendo melhor. Qual a 'tomada' a usar na sala de montagem? Meirelles explica: "na sala de montagem com o Daniel, vimos que o ideal seria usar a quarta tomada da Julie, ainda quente, mas menos descontrolada e a oitava do Mark. O Daniel vai ter que dar um truque, montando partes de falas rodadas em momentos diferentes e sem um dos microfones, talvez tenhamos que assumir alguma descontinuidade na figuração, mas isso faz parte". E conclui, com o seu típico sentido de humor: "E quer saber? Se numa cena destas alguém ficar olhando para o fundo da sala para procurar erro de continuidade, merece encontrar. Um baita esforço deste para nêgo vir dizer que não gostou do filme porque o barbudinho atrás da Julianne desapareceu no segundo contraplano? Give me a break!." (cont.)

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