Nas suas magníficas memórias ('O meu último suspiro', Fenda), Luis Buñuel diz: "Detestei 'Roma, cidade aberta' de Rosselini. Achei que o contraste fácil entre o padre torturado e, na sala contígua, o oficial alemão bebendo champanhe com uma mulher no colo era um procedimento repugnante."
Não concordando com D.Luis no que respeita ao excelente filme de Rosselini, lembrei-me destas palavras nos primeiros minutos de 'Líbano'. Um carro dirige-se ao tanque israelita onde se passa todo o filme. O atirador desobedece às ordens de disparar ('não consegui, nunca atirei em ninguém, só em latas') e em consequência um colega seu é morto. A seguir dispara sem aviso contra uma carrinha que se aproxima e - adivinhem - mata um inocente vendedor de galinhas. Não diria que o procedimento é repugnante, mas não prima certamente pela subtileza - e condicionou desde logo a minha adesão ao filme.
O realizador Samuel Maoz foi soldado na primeira guerra do Líbano e percebe-se o que pretende: desconstruir a ideia feita do exército israelita como uma implacável máquina de guerra. O exército é constituído por rapazes como ele e outros, mal preparados, emocionalmente instáveis, que queriam estar em toda a parte menos ali. Mas, para demonstrar a sua tese, Maoz carrega demasiadamente nas cores e cai num outro extremismo: eu nunca me acreditei no bando de bebés chorões e assustadiços daquele tanque.
Naturalmente eu nunca estive na guerra do Líbano nem em qualquer outra e não posso contestar que as coisas eram mesmo assim; mas posso contestar a maneira do realizador mostrar as coisas, e esta sobre-simplificação exemplificativa e hiper-demonstrativa arruina o filme, que até parte duma boa ideia cénica (todo um filme passado nos escassos metros quadrados de um tanque de guerra) e é indubitavelmente bem filmado. Um tiro ao lado.
Lebanon, Alemanha/Israel/França, 2009. Realização: Samuel Maoz. Com: Oshri Cohen, Zohar Shtrauss, Michael Moshonov, Itay Tiran, Yoav Donat, Reymond Amsalem, Dudu Tassa.
2 comments:
Concordo em absoluto.
:)
http://ordet1.blogspot.com/2010/05/lebanon-samuel-maoz.html
bom, já somos dois a fugir ao consenso... :)
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