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10.4.05

Livraria (II)













O título “1001 filmes para ver antes de morrer” diz tudo sobre o objectivo deste livro. Coordenado por Steven Jay Schneider, um crítico norte-americano, conta com textos escritos por quase 60 colaboradores de várias nacionalidades, sendo no entanto a grande maioria norte-americanos. Uma listagem destas é sempre discutível ou até polémica, mas 1001 filmes permitem uma margem suficiente para não deixar de fora (quase) nenhum grande clássico. O livro começa com ‘A viagem à lua’ de Georges Meliès [1902] (e porque não começar com o reconhecidamente primeiro filme -completo e estruturado- da história do cinema, a ‘Chegada de um comboio’ de Louis Lumiére ?) e termina com ‘Kill Bill 1’ de Tarantino [2003].
Os autores tentam atingir um equilíbrio entre filmes que se destacaram pelo seu sucesso comercial, pelo artístico, ou por serem representativos de um género (documentário, animação, etc.) ou movimento (blaxpoitation, por ex.). Assim sendo, não é de admirar que o realizador mais representado (de longe), seja um que conciliou o sucesso comercial com o reconhecimento artístico: Alfred Hitchcock, que tem direito a 18 entradas. O mesmo se pode dizer do segundo mais representado, Howard Hawks (11 entradas), repartindo o terceiro lugar, com 10 filmes cada, dois ‘autores’, Ingmar Bergman (primeiro europeu) e Stanley Kubrick, fechando a escassa lista dos ‘2 dígitos’. Bergman à parte, os realizadores em actividade mais representados são Steven Spielberg e Martin Scorcese, ambos com 9 filmes listados, tantos como John Ford e Luis Bunuel. Não creio que a história venha a ser assim tão generosa com eles, principalmente para com o primeiro…
Falando agora um pouco das nacionalidades representadas, refira-se que não há um único realizador Português seleccionado, o que não será surpresa para ninguém, penso: Manoel de Oliveira, muito bem cotado em certos círculos Europeus, não atingiu ainda assim o reconhecimento internacional de um Kiarostami (4 filmes) ou de um Angelopoulos (2 filmes), por exemplo, enquanto que João César Monteiro é demasiadamente idiossincrático e penso que mesmo desconhecido, para aparecer numa compilação deste género. Naturalmente a cinematografia mais representada é a Americana, seguida da Europeia, com autores como os já citados Bergman e Bunuel, mas também Godard, Fellini, Renoir e até Bresson e Dreyer, representados com entre 8 e 4 filmes. Por contraste, mestres japoneses como Ozu e Mizoguchi não têm direito a mais de 3 filmes, menos por exemplo, do que Paul Verhoeven - e até o cinéfilo mais empedernido poderia morrer descansado sem ter visto nenhum filme deste holandês! Seja como for, o tempo já fez a sua selecção, e não há nenhum grande realizador do passado que, melhor ou pior, não esteja representado. É mais interessante olhar para os realizadores em actividade, aqueles cuja selecção é mais arriscada. É, assim, curioso notar que um realizador que caminha a passos largos para se tornar um clássico, Clint Eastwood, apenas esteja representado por 3 filmes (mesmo se tivermos em conta que o livro é anterior a 'Mystic River' e 'Million Dollar Baby'), contrastando com os já referidos Spielberg, Scorcese ou mesmo Woody Allen (7 filmes). A ‘nova geração’ Americana está bem representada, com Tarantino (3 filmes), P.T.Anderson (2), Wes Anderson (2) e até Spike Jonze e David O.Russel (1 filme cada) – falta Sophia Coppola, mas à data ainda não tinha realizado a sua opus magna; a Europeia nem tanto, mas aqui os consensos são mais difíceis: a geração pos - Von Trier (4 filmes) e Almodôvar (3) está praticamente ausente, não estando presente nenhum filme de François Ozon, por exemplo. Isto aliado ao facto de só termos um Kusturika, reforça a sensação de que a Europa teve menor atenção…Em compensação, há uma atenção especial às emergentes cinematografias orientais, de Taiwan (Ming-liang, Edward Yang, Ang Lee), Japão (Miyazaki, Miike), Hong-Kong (Kar-wai), China (Chen Kaige, Zhang Yimou) ou Coreia do Sul (Sang-jin). Seja como for, a única grande ausência que me saltou à vista foi Nick Park, criador dos excelentes Wallace & Gromit, talvez por se inserir num género muito particular, as curtas-metragens de animação.
Mas passemos aos textos em si, que procuram fazer uma sinopse do argumento e uma análise critica do filme. Naturalmente que com 60 pessoas a escreve-los, os resultados são algo desiguais, embora resultem num todo razoavelmente homogéneo. Não se podendo atingir grande profundidade com 200 ou mesmo 500 palavras, as análises são de um modo geral leves mas interessantes, embora se abuse um pouco de expressões do género ‘um filme muito imitado, mas nunca ultrapassado’ ou ‘o melhor filme de sempre passado num talho’. Outra critica que se poderá apontar é o facto de por vezes o autor do texto não se mostrar particularmente entusiasmado com o filme que está a analisar, o que poderá levar o leitor a perguntar porque raio foi então seleccionado!
Concluindo, e apesar destes pequenos reparos, pode-se dizer que é um livro francamente aconselhável, dada a boa representatividade quer dos filmes mais importantes da história do cinema (não obstante cada leitor certamente lamentar a ausência de um ou mais dos seus filmes favoritos (*)), quer das tendências do cinema actual, bem como pelo interesse que a grande maioria dos textos desperta, mesmo sobre filmes que à partida não nos motivariam muito. São novecentas e tal páginas que se devoram a eito, e isso não é elogio de somenos!

(*) E este é um exercício que os cinéfilos não deixarão de fazer. Eu pessoalmente lamento(entre muitas outras) as ausências de 'Irmãos Inseparáveis' (Cronenberg), 'Lilith' (Robert Rossen) ou, já agora…'Duelo ao Sol'!

5 comments:

pedro said...

também tenho este livro e atribuo-lhe um outro mérito. para tirar dúvidas de compositores de ost, actores, datas... quando o imdb não está à mão

mr pavement said...

interessante sugestão. já o observei numa estante mas não cheguei a folhear. quando tiver oportunidade dar-lhe-ei atenção.

cumprimentos

pedro said...

nem tinha reparado que havia um link no lilith.

o filme é um segredo. deve ser o 1002 da lista

ou para ver antes de nascer ou depois de morrer.

olha, aí está um rubrica porreira: "filmes para ver depois de morrer"

pedro said...

não está relacionado com o post:

P.Bogdanovich: Qual é o sentido da porta que se abre para John Wayne no inicio d'"A desaparecida" e se fecha sobre ele no final? J.Ford: Mmhmm...

está muito engraçado.

Unknown said...

Lilith: sendo uma obra-prima, é surpreendentemente desconhecida. Não sei porque será.