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26.11.05

Grizzly Man



Na semana em que em que estreou em Lisboa mais um documentário ('Rize', de David LaChapelle), chegou ao Porto 'Grizzly Man'. Nestes casos o resto do país é paisagem, mas seja como for, e como já aqui referimos, continuam a estrear regularmente documentários em Portugal, hábito saudável que esperemos que seja para durar.
Como o titulo indica, este filme não é sobre grizzlies (ursos-pardos), mas sobre o grizzly man, ou seja Timothy Treadwell, ambientalista americano sui generis que passou 13 verões (quando os ursos não estão a invernar) na companhia destes animais selvagens até ser comido por um. Como diz uma pessoa entrevistada no filme, estava mesmo a pedi-las. O que também estava mesmo a pedir, era ser feito um documentário sobre Treadwell, uma verdadeira personagem, inclassificável. Ex-candidato a actor (supostamente não conseguiu um papel em Cheers por pouco...), ex-alcoólico, ex-uma data de coisas, encontrou a sua redenção na companhia destes ursos. Todos os Verões passava uns meses embrenhado nas florestas do Alasca na sua companhia, ignorando as mais elementares regras de segurança - dizia que era o seu único protector contra os humanos hostis (auto-intitulava-se de kind warrior), filmava tudo e depois divulgava os filmes pelas escolas e na televisão, tendo-se tornado uma celebridade.
Não admira que Werner Herzog, realizador de projectos demenciais como 'Aguirre' ou 'Fitzcarraldo' se tenha interessado por ele. Como Herzog depressa se apercebeu, o verdadeiro protagonista dos filmes de Treadwell não são os ursos, mas o próprio Treadwell. Sempre impecavelmente barbeado, com a franja no sítio (ou com um lenço na cabeça), este discorre sobre tudo e mais alguma coisa em frente à câmara, tendo os ursos como pano de fundo. Não só sobre o antagonismo entre o mundo animal (puro, belo, inocente) e o mundo dos homens (que cada vez odiava mais), como também, e principalmente, sobre ele próprio: porque é que as namoradas não aguentavam muito tempo com ele, como tinha deixado a bebida graças aos ursos, quão corajoso era em lidar tão de perto com as feras, etc., etc. Um narcisismo delirante, que faz parecer Tarnation uma brincadeira de crianças.
Herzog ficou fascinado pela personagem, mas não pelas suas causas. Sendo ele próprio o narrador do filme (com o seu forte sotaque alemão), vai contrariando uma a uma as teses de Treadwell. Onde este via o mundo dos animais perfeito, Herzog vê um mundo em que os machos matam as crias para as fêmeas não terem que as amamentar e poderem fornicar (sic) de novo; onde Treadwell se achava o salvador dos ursos, Herzog contrapõe com números que mostram que estes estão longe do perigo de extinção; onde Treadwell via expressões de afecto no focinho de um urso, Herzog apenas vê um ser entediado a olhar para uma possível vitima; e por aí adiante. Este confronto entre duas personalidades como Treadwell e Herzog, é um dos pontos mais fascinantes do filme - se a matéria-prima era de eleição, um realizador como Herzog conseguiu construir com ela um objecto ainda mais brilhante.
Um grande documentário e seguramente um dos melhores filmes do ano.
Grizzly Man, EUA, 2005. Realização: Werner Herzog. Com: Timothy Treadwell, Amie Huguenard, Franc G. Fallico, Werner Herzog, Warren Queeney, William Fulton.

1 comments:

Sunday Morning said...

gostei muito de ler a tua critica sobre o filme.
o filme reflecte muito sobre a mente de Treadwell, herzog deu
como exemplo os glaciares.
gostei bastante deste documentário