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15.1.06

Nada a esconder



Michael Haneke não é um cineasta de temas fáceis. Nos seus anteriores filmes já nos mostrou dois jovens psicopatas que se divertem a aterrorizar familias da classe alta ('Funny Games'), uma solitária e emocionalmente complexa professora de musica que só encontra o prazer numa relação masoquista ('A pianista') ou um mundo apocaliptico onde reina a desolação e os instintos primários de sobrevivência ('O tempo do lobo').
O inicio de de 'Nada a esconder' mostra-nos um longo plano fixo de uma casa, assim sem mais - enquanto se vai desenrolando o genérico na horizontal. Uma cassete com esta filmagem é enviada aos donos da casa, um bem sucedido apresentador de um programa literário da televisão e a sua mulher. Não obstante o caracter aparentemente inócuo do conteudo da cassete estes ficam logo apreensivos, e o espectador (principalmente o conhecedor de Haneke) também. Outras cassetes se seguem e a interrogação cresce: quem as manda e porquê? Dir-se-ia estarmos perante um policial, mas a atenção do realizador foca-se sobretudo nas reacções do casal: ele sabe mais do que diz à mulher e esta não admite nem suporta essa falta de confiança instalando-se um clima de ruptura entre eles. Até aqui tudo bem, esta tensão é magnificamente explorada, suportada nos dois excelentes actores, Daniel Auteuil e Juliette Binoche(e já se notam os seus 42 anos!). O pior é quando começa a surgir a explicação do mistério: estará tudo ligado à infância de Auteuil e a uns ex-empregados magrebinos dos seus pais. Auteuil carrega ainda hoje um sentimento de culpa sobre algo que se passou (apesar de ter 6 anos na altura!) e percebemos a metáfora óbvia: é do sentimento de culpa da França em relação ao seu passado colonial que Haneke nos quer falar. O filme é sempre muito ambiguo, nunca temos certezas sobre nada e o final é mesmo algo desconcertante, ficando tudo muito em aberto. Mas também isso não interessa muito, já que o filme há muito que trocara o policial pelo politico, pelo que é na psicanálise (colectiva?) e não na investigação detectivesca que se têm que encontrar as respostas.
Eu preferia que se tivesse ficado pelo policial, mas aí, em boa verdade, não seria um filme de Haneke.
Caché, França/Áustria/Alemanha/Itália, 2005. Realização: Michael Haneke. Com: Daniel Auteuil, Juliette Binoche, Maurice Benichou, Annie Girardot.

1 comments:

Ademar de Queiroz (Demas) said...

Ainda não vi "Caché" - não chegou ao circuito da minha cidade. Mas gosto muito do Haneke e estou na maior expectativa em relação a esse filme. Abração.