Um grupo de produtores teve a ideia de desafiar 15 cineastas reconhecidos, todos mais ou menos da área 'independente', a fazerem um sketche de 10 minutos cada sobre 'o tempo' - tendo este como ponto de partida, como mote. O filme foi dividido em duas partes, 'The Trumpet' e 'The Cello' - sinceramente não percebi bem a distinção entre as duas, mas diria que a qualidade global da primeira é bastante razoável, a da segunda nem tanto, o que, digo eu, não espanta tendo em conta os respectivos realizadores: Aki Kaurismäki, Víctor Erice, Werner Herzog, J. Jarmusch, W. Wenders, Spike Lee, Kaige Chen versus B.Bertolluci, M.Figgis, Jiri Menzel, I.Szabo, Claire Denis, V.Schlondorff, Michael Radford, Jean-Luc Godard.
Não 0bstante o bom sketche de Jarmush, com Chloe Sevigny a fazer de melancólica movie star, na primeira parte, 'The trumpet', destaca-se claramente 0 segmento de Wim Wenders, 'Twelve Miles to Trona', que é seguramente o seu melhor trabalho em muitos anos. É um feliz regresso à paisagem americana, ao imaginário americano de 'Paris-Texas', trocando Ry Cooder pelos Eels, e o opaco Travis/Harry Dean Stanton por um intoxicado Bill/Charles Este. Este está a sofrer alucinações e os seus delírios fundem-se com a paisagem e com o imaginário on the road de muita literatura americana. Simples e marcante.
Na segunda parte, 'The Cello', dois destaques. O primeiro para o surpreendente 'One Moment', de Jirí Menzel (o autor do 'clássico' 'Closely Watched Trains'): trata-se de um estranho exercício sobre a memória, em que vemos uma personagem que vai recordando imagens, cenas, aparentemente do seu passado. Sob a música apaziguadora de Leos Janacek vamos assistindo a diversas sequências que não percebemos bem, parecem tiradas de filmes... e são mesmo. Deduzimos às tantas, e confirmamos no genérico, que são imagens de arquivo do actor Rudolf Hrusínský. O efeito é bastante raro, parece que acabámos de assistir a um filme mudo sem lógica aparente.
Finalmente referência para o último segmento, 'Dans le noir du temps', de Godard. Daquela maneira que só ele sabe, combina imagens de diversos filmes, incluindo vários seus, com extractos de Virginia Wolf e Wittgenstein, e música de Arvo Part... O resultado é um magnético exercicio poético e cinéfilo.
E será por acaso, que num filme cujo mote é o tempo, os 3 mais interessantes exercícios recorram à citação e, mais ainda, à auto-citação?
5 comments:
Eu fiquei arrebatada pelo contributo de Erice :)
Achei curiosos os teus destaques, porque concordo que o nível do Trumpet é melhor que o do Cello, mas acho o filme do Wenders totalmente aberrante, parece um filme do início dos anos 80, quando descobriram as maravilhas dos efeitos do video, assustador. Já o filme do Erice, que não falas, acho absolutamente maravilhoso (melhor ainda que o do Godard), como em 10 minutos se conta o mundo inteiro.
Parece que o do Erice é um favorito de muita gente. Eu achei-o vulgar, passe a heresia.
Quanto ao do Wenders, olha, gostei memo. Talvez pelo facto de me ter feito lembrar tanto o Paris Texas.
O episódio do Erice justifica a existencia do projeto.
Bom. Vou mesmo rever o episódio do Erice!
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