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10.10.05

Alice



Como li algures, Alice é o filme português de que se fala. Teve uma boa campanha de marketing, uma boa recepção no Festival de Cannes e boas criticas na generalidade da imprensa portuguesa - se terá público é outra história.
Na minha opinião, alguns dos motivos pelos quais o filme tem sido elogiado são baseados em equívocos. Desde logo, haverá uma nova visão de Lisboa. Não sendo Lisboeta, nem conhecendo particularmente bem a cidade, não serei a melhor pessoa para contrariar esta afirmação, mas parece-me que o facto de Marco Martins a fotografar de manhã ou ao escurecer, com tempo cinzento, permanentemente com uma fotografia escura, fugindo ao 'cliché' da luminosidade da cidade não implica por si só uma visão diferente. Nem por mostrar filas de transito intermináveis ou multidões anónimas: por aqui o filme tanto podia ser passado em Lisboa como noutra grande metrópole qualquer. Aliás penso mesmo que estes longos planos de estradas, de ruas, do aeroporto, estilizados, com cores artificiais, repetitivos, acabam por ter o efeito contrário ao pretendido pelo realizador: em vez de transmitirem um ambiente geral de dor, de perda, acabam por se tornar decorativos e monótonos, abafando as personagens e os sentimentos, fazendo lembrar algum do pior Wim Wenders. O mesmo se pode dizer da interpretação de Nuno Lopes: compor uma personagem lacónica, sonâmbula, algo autista, é o mais óbvio para transmitir dor e não me parece que seja especialmente difícil um papel destes. Compare-se por exemplo a languidez escura de Alice com a luminosidade gélida de Saraband, com as suas personagens bem vivas, mas onde os sentimentos de dor e de perda nos atingem de maneira bem mais profunda. Outro equívoco tem a ver com a velhinha questão do cinema português, das suas especificidades, do seu virar de costas ao público. Este seria um filme diferente, um filme de autor mas virado para o público. Este parece-me um equívoco dos grandes: Alice tem algumas das marcas registadas que o grande público (de pior) associa ao cinema português, nomeadamente uma fotografia escura e um desenvolvimento narrativo lento (para não dizer chato). Salva-se o som, muito acima da média. Cinema de autor não umbiguista há um realizador a faze-lo, e muito bom, em Portugal - mas chama-se João Canijo. Posto isto, refiram-se as qualidades do filme, que também as tem: um magnifico conjunto de actores secundários (incluindo Beatriz Batarda, que na prática tem um papel secundaríssimo), uma excelente banda sonora de Bernardo Sassetti e uma boa ideia de argumento, não totalmente desenvolvida, que são os sketchs cómicos de Nuno Lopes e Miguel Guilherme que compõem o necessário contraponto à história principal.
Alice, Portugal, 2005. Realização: Marco Martins. Com: Nuno Lopes, Beatriz Batarda, Miguel Guilherme, Ana Bustorff, Laura Soveral, Gonçalo Wallenstein.

5 comments:

David Santos said...

hmmm..
bom texto
vai um pouco contra a corrente.
terei de ir ver para ter a minha propria opinião.

desenvolvimente lento da narrativa confesso que me assusta, algo tipico no cinema portugues.

Unknown said...

Sim. Mas, apesar das minhas reservas, acho que é um filme que vale a pena ver.

Mojo Pin said...

Gostei da tua crítica, vou estar atenta. Mas aconselhas a ir na mesma?*

Unknown said...

Eu a não ser que um filme seja verdadeiramente mau, acho sempre que vale a pena ir ao cinema. Como dá para perceber da minha critica eu não gostei muito do filme, mas não dei o tempo (e os 5€!) por mal empregues. Até porque não estão muitas coisas interessantes nas salas de cinema actualmente...

gonn1000 said...

Concordo, o filme não é a pérola perdida que muitos apregoam e tem defeitos evidentes, mas é uma primeira obra promissora.