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25.2.06

Fantasporto (II)



Apesar da abertura oficial do Fantasporto 2006 apenas ter ocorrido ontem à noite, um dos eventos mais apetecíveis desta edição já se desenrolou ao longo da semana passada - a já aqui referida 'RETROSPECTIVA EXPRESSIONISMO ALEMÃO'. Como ainda não tinha tido oportunidade de assistir a qualquer sessão, ontem ataquei uma jornada dupla: primeiro 'Fausto' (1926) e depois 'Nosferatu' (1922), ambos de F.W.Murnau, um dos maiores (para muitos o maior) cineastas do mudo. 'Nosferatu' será porventura a mais conhecida obra de Murnau, e tem algumas das imagens mais iconográficas da história do cinema. Mais de oitenta anos e toneladas de efeitos especiais depois, ainda não foi realizada uma versão de 'Drácula' que se lhe compare. Quanto a 'Fausto', foi para mim uma revelação. Nunca tinha visto este filme e, numa palavra, fiquei deslumbrado.
Mas mais do que falar dos filmes, sobre os quais já quase tudo foi dito, gostaria de me referir às cópias apresentadas. No programa do Fantas é indicado: v.o. leg.espanhol para 'Fausto' e v.o.leg.inglês para 'Nosferatu. Sendo ambos os filmes mudos, a indicação versão original só se poderá referir aos entretítulos, penso eu! Ora não foi isso que aconteceu: não havia legendas, mas sim os próprios entretítulos eram em espanhol e inglês, o que não é rigorosamente a mesma coisa. Não se trata de um preciosismo ou esquisitice da minha parte - os entretítulos eram parte integrante do trabalho criativo dos autores do mudo, como pode facilmente constatar quem assistiu ao recentemente reposto nas salas 'Aurora', em que por exemplo numa frase em que se falava dum afogamento, as próprias letras iam caindo, como que afundando-se. Os entretitulos dos filmes de outro mestre do mudo, D.W.Griffith, tinham inclusivamente a sua assinatura estampada! Se no caso de 'Nosferatu' os entretítulos, ingleses, ainda eram cuidados, com um tipo de letra usado na altura (talvez reproduzindo os originais), no caso de 'Fausto', em espanhol, eram uma desgraça, com uma letra tipo Times New Roman ou algo no género, ainda por cima com uma tradução que me pareceu descuidada.
Mais grave ainda, na minha opinião, é outro aspecto: as bandas sonoras que acompanharam ambos os filmes. Para começar não há qualquer indicação sobre elas no programa, e se na de 'Nosferatu' é indicado no início do filme quem a compôs e executou, na de 'Fausto' ficamos na mais completa ignorância. Sendo moda hoje em dia compor bandas sonoras para filmes mudos, é preciso ter um enorme cuidado e sensibilidade ao faze-lo. Não nos esqueçamos que se está a adicionar a uma obra de arte um elemento em que o seu criador não pensou, sendo assim de certo modo uma alteração daquela. Devido a isto e ao facto da maior expressividade dos actores do mudo, o compositor de musicas para filmes mudos, mais que que ninguém, deveria ter sempre presente a máxima de Robert Bresson: 'o que é para o olhar não deve ser redundante com o que é para o ouvido'. Infelizmente este conselho não foi seguido pelos autores das bandas sonoras que acompanharam estes filmes, ambas oriundas da música electrónica, sendo bastante impositivas e sobrepondo-se irritantemente às imagens, nomeadamente na primeira meia hora de 'Fausto'. Os seus autores esqueceram-se que as pessoas pagam bilhete para assistir a um filme, não para ouvir música acompanhada de imagens.
Não obstante estas duas obras-primas sobreviverem a isto e muito mais, não podemos deixar de lamentar a falta de cuidado da organização do Fantas com as cópias que apresentou. Se já seria um desleixo grave numa sala normal, então no âmbito de um festival de cinema...

2 comments:

Tiago said...

Concordo em absoluto contigo quando falas das bandas sonoras. Resumo isso a apenas uma palavra: revolta. Já agora, eu estive lá :)

Abraços.

Unknown said...

A banda sonora que acompanhou o 'Dr.Mabuse' era francamente melhor, mas continuámos sem ter qualquer indicação da sua origem...