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22.2.06

Os três enterros de um homem



O argumentista deste filme é Guillermo Arriaga, conhecido por baralhar as coordenadas espacio-temporais das suas histórias, ora com muito bons resultados (Amor cão), ora com muito maus (21 gramas). Aqui só se nota a sua 'marca' no inicio do filme, em que demoramos algum tempo a perceber o que é que se passa quando. Depois disso, a complexidade está toda guardada para a narrativa em si, e não para a forma como esta se desenrola. E ainda bem. 'Os três enterros...' é um 'filme de fronteira', género com tradição própria em Hollywood (exemplo próximo e óbvio: 'Um corpo no deserto' de John Sayles). Passa-se entre a fronteira do Texas (onde um cego ouve um relato de um jogo de futebol em espanhol, apesar de não entender uma palavra) e o México (onde uns miudos assistem a uma soap opera apesar de não perceberem nada) e o seus protagonistas são Mexicanos que buscam emprego nos States, guardas fronteiriços e vaqueiros. E a paisagem claro, fotografada magnificamente por Chris Menges em tons baços e quentes, que nos remete para o universo dos westerns. Tanto assim é que quando uma personagem olha para uma montra com plasmas até estranhamos, pois já tínhamos recuado instintivamente 50 anos, apesar de a acção se passar nos dias de hoje.
Tommy Lee Jones, que aqui se estreia na realização cinematográfica, citou como sua principal influência Sam Peckinpah e faz sentido: não só o titulo original ecoa o Peckinpahniano 'Bring Me the Head of Alfredo Garcia', como a violência e a secura daquele estão todas aqui, embora de um modo mais subtil. Como em todo os bons filmes há vários níveis de interpretação neste, e todas as personagens são mais complexas do que parecem à primeira vista: o assassino de Melquiades Estrada é um homem racista e violento, mas acaba por encontrar a redenção; Peter Perkins (Tommy Lee Jones), a única pessoa que procura a verdade e quer cumprir o desejo de um amigo morto, revela aqui e ali traços de um carácter mórbido e até violento; e mesmo Melquiades, que só queria ser enterrado na sua terreola não era quem parecia ser. Os próprios secundários relevam maior profundidade do que aparentavam (o xerife que não queria chatices; a mulhera adultera-grande personagem; a mulher do assassino).
Não obstante ser um pouco longo demais, 'Os três enterros de um homem' mostra-nos que um grande actor pode ser um grande realizador. E temos o exemplo de Clint Eastwood...
The Three Burials of Melquiades Estrada, Estados Unidos/França, 2005. Realização:Tommy Lee Jones. Com: Tommy Lee Jones, Barry Pepper, Julio Cedillo, Dwight Yoakam, January Jones, Melissa Leo, Vanessa Bauche, Levon Helm.

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